Barack Obama (ii)
Obama vence em três previas e ultrapassa Hillary, manchete em todos os jornais e portais de internet. Uma eleição que parecia até a pouco tranqüila virou um emocionante enfrentamento. Estou reunindo material para escrever um artigo mais denso, nos próximos dias, sobre a eleição norte-americana, algo mais que somente uma postagem de blog. Escrevi há tempos sobre a Guerra do Iraque (a primeira e a segunda), de maneira que vou seguir, no caso da eleição norte-americana, o fio de uma meada analítica. Em resumo, trabalho com uma certeza e duas hipóteses. A certeza: fica complicado analisar as eleições nos EUA sem uma embocadura histórica. Penso, por exemplo, em eventos e processos do escopo da explosão populista do começo do século XX, os embates do new deal e a estratégica geopolítica de hegemonia mundial posta em prática pelo Departamento de Estado, já durante a Segunda Guerra. Sem saber direito o motivo inconsciente, quando o assunto é sociedade e política nos EUA, a primeira referência que me vem a cabeça é o atormentado poema "Kaddish", de Allen Ginsberg - um lamento fúnebre de um filho sobre a morte da mãe. Nas fímbrias do poema, ficamos sabendo da saga da mãe do poeta: um imigrante russa, trostkista, às voltas com os impasses políticos da crise de 29 e do new deal, indo ao extremo de danificar a saúde mental. Certamente, de alguma maneira, a derrota narrada em "Kaddish" (em um registro mais realista, por exemplo, poderíamos recordar os romances "As Vinha de Ira", de John Steinbeck ou "Babbit", de Sinclair Lewis), não é um caso isolado, mas a representação atrística, no poema beat de Ginsberg, de uma geração que sentiu na pele a vigência do fordismo, junto com a necessária derrota do movimento operário em sua feição mais clássica, digamos, de esquerda revolucionária e marxista. Nos Estados Unidos, para quem não sabe. Toda essa revisitação às fontes históricas para afirmar o seguinte: estão redondamente enganados os que pensam que os EUA têm uma história pacífica, uma sonolenta disputa entre dois partidos políticos parecidos. Nada. Recentemente, quando da “queda do muro de Berlim” (já escrevi a propósito) ganhou peso uma nova estratégia – divergente da dos tempos da guerra fria, que foi formulada por intelectuais como G. Kennan e Nicholas Spykman – de domínio imperial, através da força e da coerção ideológica. Tivemos a novidade, essencial, pois não havia antes do fim da guerra fria, da aliança entre os chamados “neoconservadores” (mais abertos no terreno moral) e da direita cristã. O ápice do sucesso da aliança neocon-fundamentalistas foi precisamente a eleição presidencial de 2004, entre G.W. Bush e John Foster Kerry. Passamos daqui à primeira hipótese: a hegemonia neoconservadora começou a declinar e encontra-se mesmo em xeque. Segunda hipótese, mais importante, pois chama a atenção para um processo de novas determinações, essencialmente aberto: para além dos programas políticos dos candidatos, começa a ocorrer um ressurgimento do confronto social e político no seio da sociedade civil americana, que deve ser acompanhado e até saudado. (Jaldes Reis de Meneses).
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