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Mostrando postagens de setembro, 2007
Jaiel de Assis Tenho um grande carinho por muitas figuras humanas, pessoas as quais perdi contacto, muitas das quais retornei pela internet. Uma delas, Jaiel de Assis, uma pessoa importante na música paraibana dos idos dos anos 70, junto com Pedro Osmar, Ivan Santos, Paulo Ro, Aranha, Zé Ramalho, etc. Jaiel tem uma origem meio ambígua entre o Roger e Jaguaribe, mas, enfim, um cara importante e meio esquecido (ou não?) na esquecida trajetória da música popular na Paraíba. Recordo principalmente (por que recordo disso?, tenho memória de cão, da comemoração de um ano novo, creio em 1978 - quase trinta anos e parece que foi ontem -, tinha 18 anos, na qual Jaiel apontava um novo futuro pra o Brasil, a sociedade brasileira, o mundo. Me impressionou). Eu já exercitava umas teses pela esquerda nessa época em Jaguaribe, participando e às vezes desconfiando do vanguardismo do Jaguaribe Carne, que vi nascer na origem mais remota, mas também polemizava, meio como um advogado do diabo. Acompanhava

Guy Debord:

"O espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas, mediada por imagens". In: DEBORD, Guy. A sociedade do Espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997, p. 14.
Eleonora e a nave Belo, o Teatro Santa Rosa, aquele salão inteiramente recoberto de pinho de riga, aquele largo palco italiano de tantas histórias. Tive esses pensamentos, reconheço, nada originais, no espetáculo de lançamento do novo disco da cantora e compositora Eleonora Falcone. Eleonora estava em casa, ela se adapta ao palco (“Eleonora e a nave”: a sonoridade de um verso). Nem todas as cantoras conseguem dominar o palco de um teatro. Por outro lado, fiquei, de alguma maneira, macambúzio, por uma intuição que comentei com Cida e alguns amigos: creio que as pessoas estão se “desacostumando” com a forma do espetáculo musical em teatro; com cenário, conceito e atenção concentrada na audição. Hoje, predomina em música, a audição no ginásio, em bar, em praça pública, tudo isso em geral ligado a muita bebida e dança. O bar, o ginásio, a praça pública, desconcentram. Trata-se de uma perda estética, uma regressão da audição. O processo já começou há muitos anos com a impaciência geral para

Hai-kai e kai-quase (IV)

A grande questão, no fundo, é a seguinte: o que realmente importa não é, precisamente, a forma fixa, mas o que fazemos dela, um pouco parafraseando Sartre. Ou seja: a questão fundamental não é o que o hai-kai é, mas o que fazemos dele. Tenho uma cisma com dois extremos: tanto o que se adequou pacificamente à forma fixa como o que desconhece a rica tradição da poética, a maneira pela qual as formas poéticas foram aparecendo e se impondo como tradição. Nos dias atuais, percebo que começam a aparecer, entre novos poetas e alguns já rodados, um conjunto de maneiras, algumas ricas e outras nem tanto, de lidar com a tradição e a inovação. São dois os extremos: quem se satisfaz com a tradição e quem a desconhece. Há um fundo comum entre as duas situações: a exaustão do discurso da vanguarda, que gerou uma saudável liberalização, mas ao mesmo tempo uma circunstância de convivência, em espaços alternados, tanto de formalismo como de vale tudo. A propósito de um dos que se satisfaz com a tradiçã

Hai-kai e kai-quase (III)

A grande questão, no fundo é a seguinte: o que realmente importa não é, precisamente, a forma fixa, mas o que fazemos dela, um pouco parafraseando Sartre. Ou seja: a questão fundamental não é o que o hai-kai é, mas o que fazemos dele. Tenho uma cisma com dois extremos: tanto o que se adequou pacificamente à forma fixa como o que desconhece a rica tradição da poética, a maneira pela qual as formas poéticas foram aparecendo e se impondo como tradição. Nos dias atuais, percebo que começam a aparecer, entre novos poetas e alguns já rodados, um conjunto de maneiras, algumas ricas e outras nem tanto, de lidar com a tradição e a inovação. São dois os extremos: quem se satisfaz com a tradição e quem a desconhece. Há um fundo comum entre as duas situações: a exaustão do discurso da vanguarda, que gerou uma saudável liberalização, mas ao mesmo tempo uma circunstancia de predomínio alternado tanto de formalismo como de vale tudo. A propósito dos que se satisfaz com a tradição (prefiro não citar o

Hai-kai e Hai-quase (III)

Recebo mais um hai-kai do poeta Lau Siqueira, também muito bom, embora possa ser um hai-quase. O poeta desdorda da forma fixa do hai-kai somente no último verso. A questão é a seguinte: temos uma forma ao nosso dispor e podemos trabalhá-la de duas maneiras, aceitando o desafio minimalista proposto pela forma fixa do hai-kai (dezessete silabas poéticas, 5, 7, 5) ou desbordar, chegando até um verso livre de tipo elíptico. Ambas são válidas. Por outro lado, forma fixa ou estilizada, sobra o principal: o que os versos efetivamente dizem ao mundo. No caso de Lau, seguindo a uma classificação puramente didática, o hai-kai anterior era mais “Alberto Caeiro” (pastoral) e o segundo é mais “Álvaro de Campos” (existencial, metafísico, moderno, etc.). suicídio lento na mobília da alma os versos que invento

Hai-kai e Hai-quase (II)

Lau Siqueira Esse hai-kai do poeta Lau Siqueira, muito bom, mais Alberto Caeiro que Álvaro de Campos, por isso mesmo é mais fiel ao conteúdo das tradições do hai-kai do que o de Alice Ruiz, demonstrando que se pode fazer bem feito das duas maneiras (Jaldes Reis de Meneses): ruído d'água no rio nascente música dos peixes

Hai-kai e Hai-quase

Alice Ruiz Fisguei no blog de Eduardo Rabenhorst ( http://www.modosdedizeromundo.blogspot.com/ ), este hai-kai de Alice Ruiz, ao que parece feito em sua recente oficina em João Pessoa. Perfeito. Pena não ter participado dessa oficina, meio cristão, sei lá, me arrependo muito. Mas inventam de marcar uma oficina em plena sexta-feira, em horário de reunião e de aula! Deveria ter faltado às tarefas do cotidiano de um professor universitário, em muitos horários flanando, mas que inventou de concentrar suas atividades na sexta-feira? Talvez, não sei! Arre! Nascido no Japão, em um jogo de natureza e religiosidade budista, acho que, na importação para ocidente e o Brasil, na época de vigência do modernismo, aconteceu com o hai-kai mais ou menos a mesma coisa que com outras formas poéticas: a desvinculação rígida das formas ancestrais, que pode continuar sendo praticada, mas em convivência com as inovações (o poeta Lau Siqueira cunhou uma expressão que acho muito boa: “hai-quase”, por que não?)
Adeus, Zaratustra Jaldes Reis de Meneses Por trás da mais árida teoria Pode-se encontrar o solo da poesia. Somente o osso de uma manhã tardia Encarcerada nas badaladas do meio-dia. Adeus Fausto, adeus Zaratustra, Nada perdi recusando o beijo de Esmeralda: Não preciso de vocês, Detesto mitos e abdico dos deuses. Prefiro a companhia dos meus, Iguais a mim em imanência, Imperfeitos, solitários, gente comum.
Uma Voz no Coro: Jaldes Reis de Meneses Música, evanescente música, Canto o que flui e o que passa, canto a ti. Penetras todos os poros, circulas por todas as veias, Tens no gume o brilho da espada do guerreiro, Lima afiada de vida no tempo dissoluto do mundo. Nada como ti, és incomparável, Máscara de gesso de olhos grandes, Sois mulher, música, sois mulher.
Inverno Adoro essa canção de Adriana Calcanhoto com bela letra de Antonio Cicero (Inverno), repleta de referências. Mas as referências, por si, não conseguem fazer a canção ficar zunindo, fazendo eco distante, em nossas cabeças. Por que gosto da canção? Não sei bem, nem requer explicação. Talvez por esses dois simples versos, de tonalidade drummoniana: "faço longas cartas prá ninguém/ e o inverno no Leblon é quase glacial." Entrando a primavera, continuamos, por enquanto, somente por enquanto (o vento uiva lá fora), no inverno, ou o inverno será eterno? http://www.youtube.com/watch?v=iUk76T4PrDY
BAUDELAIRE (work in progress) Jaldes Reis de Meneses IV As coincidências embaralham. O livro se abre ao acaso, na página exata Do poema que queria ler, assinando e multiplicando O nome por dois: o poeta e sua passante, a viúva, o gato: Não se conhecem: uma exclusivamente sua, outra do mundo. Um fantasma esvoaçante, sombra que se apoderará doravante, De sua intimidade qual um conhecimento desconhecido. Convive com ela infantilmente: um ursinho de pelúcia, cobra coral: Na falta da carne, o consolo do brinquedo.
O Poeta e a Palavra Jaldes Reis de Meneses Tão lírico morreu, Tornou-se natureza morta. As palavras entortaram-no nas últimas tripas Do mais belo poema. No epitáfio, mandou cunhar alguns versos à amada, Em letras de ouro roídas pelas traças: Ave palavra, por que és tão traiçoeira, escolhes alguns, Mas não acolhes os amantes? Que tens contra, palavra, a paixão, a solidão e o tédio? Qual a dificuldade em trazer chuvas a um soneto? Por que sofres de resfriado nas madrugadas diáfanas? Por que detestas os jovens e as mulheres bonitas (esses eternos sensíveis)? Por que não tens curiosidade pelos que fazem strip-tease em praça pública? Por que és tão pudica, palavra, e não bebes nem fumas? Que mal o poeta, tão terno (já sei que detestas a ternura), te fez ou te faz? Amei-te sem correspondência, palavra. Fui e deixo-te para outros que provarão Da ilusão de tua língua cerebrina.

Resenha

NOTAS SOBRE MODERNIDADE E ESTÉTICA Jaldes Reis de Meneses [1] CICERO, Antonio. Finalidades sem fim. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. 354 p. Os espaços de debates de idéias têm escasseado na imprensa diária brasileira. De alguns anos para cá, sumiram os suplementos literários, e com eles quase desapareceu um gênero literário. A moderna crítica de cinema e literatura, o ensaio livre a meio caminho entre a nota jornalística e a tese acadêmica, por muito tempo do século passado uma tradição brasileira, praticada por intelectuais do porte de Alceu Amoroso Lima, Álvaro Lins, Agripino Grieco, Juarez da Gama Batista e Antonio Candido, entre muitos, praticamente desapareceu. Aconteceu no Brasil um movimento de passagem de uma critica cultural refinada, mas escrita legivelmente, a rápidos comentários sobre as novidades do mercado cultural, de Paulo Coelho a Gabriel Garcia Marquez. Aprendemos pouco, hoje, na imprensa cultural, reduzida a um papel de bússola e de termômetro do consumo. Foi-s
Subo e Nunca Chego ao Céu Jaldes Reis de Meneses Professor do Departamento de História (UFPB) Cidade dos Homens (direção, Paulo Morelli) não é um grande filme, mas uma produção maneira, que explora três filões narrativos: o humanismo urbano típico das figuras dramáticas do neo-realismo italiano, flagradas pela câmera em situações de risco na rua, com a diferença que, no filme brasileiro, a bicicleta do protagonista do Ladrão de Bicicleta (clássico dirigido por Luchino Visconti) foi substituída pela motocicleta de Laranjinha; a colagem frenética proposta pelo cinema-painel de Robert Altman, explorado no cinema contemporâneo de Crash e Babel; e, enfim, o hiperealismo de Cidade de Deus (o filme de Fernando Meireles, não o livro de Paulo Lins, bem melhor que o filme). Afora as três referências citadas, uma reverência: os painéis visuais entre o morro, o asfalto e praia, semelhante às tomadas panorâmicas de Rio 40 Graus, de Nelson Pereira dos Santos. Cidade dos Homens, caso dê certo na bilh
11 de Setembro: Seis Anos Jaldes Reis de Meneses Parece que foi ontem, mas já são seis anos! Estava em casa, tranqüilo, mais ou menos no final da manhã, em frente ao computador e olhando o mar, dando os acabamentos finais em uma tese de doutorado. Surpreendendo a calmaria, minha querida cunhada, Janetinha, liga dos Estados Unidos, preocupada sem desespero, e pede para ligar a televisão. Ainda a tempo de ver, em casa e ao vivo, sem nada poder fazer para impedir, o segundo avião batendo nas Torres Gêmeas. Virei (viramos todos nós) testemunha(s). Minha primeira reflexão mais comedida, depois de absorvido o impacto da imagem: somos inescapavelmente história, embora estejam nossas vidas assentadas, quase sempre, no chão modorrento do cotidiano. Antes que chegassem as primeiras análises de televisão, jornal e internet recordei duas passagens conhecidas, de dois autores, clássicos da filosofia: Hegel e Adorno. Um texto parece estar na contraface do outro, ou nem tanto, pensando melhor, se sup
Uma Dançarina Andaluza Jaldes Reis de Meneses Boa noite estrelada de poesia Menina soneto de Camões, Musa extemporânea de Bandeira E de todos os excessos de Vinicius. Eu digo a você, moça mundana: A fábula do mundo todo cabe em um poema Ou no corpo de uma dançarina andaluza De olhos grandes e carne branca. Não sei se você sabe quem é você, ou se agora finjo, Fingidor, a mais uma fantasia: A pureza de uma menina vestida Na alma de uma dançarina andaluza. Você nada é, mas ao mesmo tempo é bruma E cerração é tudo, pois nada é senão Os passos derrapantes de uma dançarina Entre a cordilheira e o abismo.
Luiz Melodia: O Gato Eletrônico Jaldes Reis de Meneses Professor do Departamento de História da UFPB. e-mail: jaldesm@uol.com.br . A minha primeira referência ao nome de Luiz Melodia, recordo bem, nem sei qual razão nem me perguntem (a memória arma dessas peças em nosso inconsciente, por vezes rememora coisas pequenas e prazerosas e recalca dores e agonias): um artigo de Jorge Mautner numa edição da revista Rolling Stone brasileira, intitulado “Luiz Melodia, o gato eletrônico” sobre um jovem negro do Morro de São Carlos que não era sambista, tinha a voz de veludo e subia telhados, feito um gato. Era 1974-75, deveria ter entre 13 e 14 anos. Trinta e dois anos depois o negro que não era sambista, na simpática acepção de Mautner, lança um disco (Estação Melodia) quase inteiramente dedicado a cantar clássicos do samba (Cartola, Noel Rosa, Geraldo Pereira, Ismael Silva, Jamelão, Osvaldo Melodia), além de uma composição recente de Melodia (Nós dois, Luiz Melodia/Renat
Baudelaire Jaldes Reis de Meneses I Através de uma baforada de ópio ou no doce verde do haxixe, Em um quarto escuro de Hotel, no século XIX, em Paris, Sentiu um fugidio instante de felicidade. Mas o vinho, o ácido Favorito dos realistas, fez Baudelaire abandonar os lençóis da cama E retornar à multidão. A revolução é uma festa de pão, rosas e cravos. Outrossim, o querubim pode ser um anjo demoníaco disposto a preparar Uma peça no poeta. O querubim prefere os paraísos artificiais, Pois nestes sequer habita a utopia, somente a satisfação. II Nunca mais, nunca mais, nunca mais, Baudelaire Abandonará o seu corvo noite adentro. Nada lhe orla a sombra Doravante, perfume, rubi, diamante, somente a sua nula Magreza nua de heroísmo. Sequer o vinho, antigo companheiro de jornadas, Irriga-lhe o sangue. Por outro lado, o pó branco das papoulas Sabe aureolar a fugacidade. O brilho das ampolas Ilumina a beleza das passagens de Paris. Sem revolução, o lirismo refugia-se junto ao ócio. III Flores ador
TRÊS VEZES LÍGIA Jaldes Reis de Meneses 1. SE QUISER A MELHOR AMIGA PERGUNTE A CAMILA E CONFIRME COM TAÍRLA: LÍGIA. 2. UMA FILHA COMO ANALINE SOMENTE OUTRA COMPLETAMENTE DIFERENTE: LÍGIA. 3. PASSO ADIANTE UM RECADO DE CIDA - A MELHOR POESIA FIZEMOS EM COMPANHIA: LÍGIA.
Ulisses Jaldes Reis de Meneses Fazer um poema sem corpo presente Com os músculos presos em um tablado Sujo de trabalho, sal e maresia. Passar pela experiência da existência Seminua de um rio sem plumas Ou de um pássaro sem canto. Ganhar o cosmo infinito No espaço escuro de um quarto. Mas sem abrir as janelas de vidro. Contemplar preso o abismo, Atraído pelo cheiro das rosas Exalantes ao fundo do poço. Escutar atento ao canto das sereias, Calado, sem esboçar reação, Como Ulisses atado ao mastro.
Porteiro do Inferno Jaldes Reis de Meneses O demiurgo Fita o aço gusa de ferro velho, Imagina o maçarico torneado, Esculpindo, cinzelando em fogo-fátuo. Bate o martelo no trabalho metalúrgico Das formas minerais. Acabado o trabalho de poiésis, Ganha a vocação de rua, Em nome da liberdade, estátua de ferro. Provoca a um estranhamento No chão circundante do asfalto No qual voamos do nada a coisa nenhuma – Asfalto liso sem a tua beleza desmedida. Pousa leve no centro da praça, Descansa em paz, suave pluma de aço. Honra o nome de quem te criou Em noites e madrugadas a fio, até O galo cantar um nome próprio, indivíduo Feito João, José ou Maria: Porteiro do Inferno. Humano, demasiado humano.