Maísa

Começou luminoso o mês de agosto... Publico a seguir, em semana de muda, um poema menor de Manuel Bandeira, que gosto muito, Maísa, como também adoro as antigas canções dramáticas - dizia-se, em algum ponto do século XX, de "fossa" - saídas de boca não-pacífica da musa de Bandeira, uma beleza marcante, estranha, tipo boca-elvis de olhos verdes, possível ser dramático e lunar.

MAÍSA

Um dia pensei um poema para Maísa
“Maísa não é isso
Maísa não é aquilo
Como é então que Maísa me comove me sacode me buleversa me hipnotiza?

Muito simplesmente
Maísa não é isso mas Maísa tem aquilo
Maísa não é aquilo mas Maísa tem isto
Os olhos de Maísa são dois não sei quê dois não sei como diga dois Oceanos Não-Pacíficos

A boca de Maísa é isso e aquilo
Quem fala mais em Maísa a boca ou os olhos?
Os olhos e a boca de Maísa se entendem os olhos dizem uma coisa e a boca de Maísa se condói e se contrai se contorce como a ostra viva em que pingou uma gota de limão
A boca de Maísa escanteia e os olhois de Maísa ficam sérios meu Deus como os olhos de Maísa podem ser sérios e como a boca de Maísa pode ser amarga!
“Boca da noite (mas de repente alvorece num sorriso infantil inefável)”

Cacei imagens delirantes
Maísa podia não gostar
Cassei o poema.

Maísa reapareceu depois de longa ausência
Maísa emagreceu
Está melhor assim?

Nem melhor nem pior
Maísa não é um corpo
Maísa são dois olhos e uma boca

Essa é a Maísa da televisão
A Maísa que canta
A outra não conheço não
Não conheço de todo
Mas mando um beijo para ela

BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira. Rio de Janeiro, José Olympio, 1986, pp 239-40.

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