Correio das Artes
O Correio das Artes, suplemento literário de A União, jornal oficial do governo do Estado da Paraíba, completou aniversário - 60 anos - recentemente. Trata-se de um feito que deve ser comemorado: a extraordinária longevidade de uma publicação situada na província literária do Brasil. Comecei a escrever muito jovem exatamente neste suplemento. Seguem, abaixo, algumas de minhas despretensiosas recordações de idos tempos:
Mal completara 16 anos de idade em 1977 e ainda estava na fase da vida na qual, feito o samba de Paulinho da Viola, o pai perguntou ao filho, futuro sambista, “se eu queria estudar filosofia, medicina ou engenharia”. Talvez quisesse ser poeta e escrevi alguns textos numa velha máquina italiana, enferrujada na dispensa da casa. Com os papéis dos primeiros poemas em mãos fui procurar o editor do “Correio das Artes”, Jurandy Moura, no sétimo andar no antigo prédio da reitoria (na lagoa).
Óculos fundo de garrafa, poeta da geração de 59 e jornalista, Jurandy excedeu o gesto de rotina de um editor – receber os poemas – e logo puxou conversa. Quis saber de por que poesia antes mesmo da leitura crítica dos poemas. A conversa terminou quase três horas depois.
Pertencia a uma geração de amigos de Jaguaribe que começava a se interessar por artes. Não tocava violão, era tímido, me interessei por literatura. A poesia em mim começou como um processo de introspecção, uma tentativa de viagem até últimos escaninhos da alma. Embora nunca mais (never more, never more) os tenha relido, tenho a impressão que meus primeiros poemas publicados no “Correio das Artes”, na quinzena seguinte à conversa com Jurandy, aparente certo desespero, que no fundo era um simples impasse juvenil. Nunca mais escrevi poemas. Somente retornei a escrevê-los, em migalhas, em 2007.
O fato é que publiquei regularmente no “Correio das Artes” entre 1977 e 1980. Foi o “período literário” de minha vida, que depois tomou outros rumos. Continuo gostando de três poemas relativamente longos daquele tempo – “Os rios e seus aflu/entes”, “Memória Escolar” e “Novas considerações do poema”, precisamente a produção que desborda do “desespero”.
Naquele tempo, as colaborações ao “Correio” eram remuneradas e nem tão irrisórias. Recordo de ter comprado livros e discos (de vinil) com o dinheirinho em cheque, apanhados no departamento financeiro de “A União”. Era quase um milagre a um poeta imberbe: ganhar dinheiro com poesia.
Longe de ser um mero detalhe, a atitude de remunerar os colaborados me parece índice do carinho do jornal para com o seu histórico suplemento literário. Mas me parece mais que isso. Quem se der à pachorra de ler os editoriais, escritos pela suave pena de Jurandy, perceberá que a insistência numa palavra repleta de significados – província.
Não é momento de fazer sociologia, contudo, para mim, a expressão província queria afirmar a existência de algo parecido com um sistema literário local. Talvez o sistema literário da província estivesse passando um período de transição, e se outras províncias literárias, parecidas com a paraibana, desapareceram, a “nossa província”, embora modificado, logrou continuidade e constituindo sistema. Os estudiosos deveriam se debruçar com mais afinco sobre o caso da longevidade do “Correio das Artes”.
Porém, mais que um sociólogo da literatura, precisa-se urgentemente de um garimpeiro dotado de mente aberta e erudição literária. Quantas relíquias desconhecidas, quantos contos e poemas, dormem em sono profundo nas páginas amareladas do “Correio das Artes”, à espera de alguém que faça a operação crítica de separar o joio do trigo. Em Borges, o sono é a morte e o sonho é a vida. (Jaldes Reis de Meneses).
Mal completara 16 anos de idade em 1977 e ainda estava na fase da vida na qual, feito o samba de Paulinho da Viola, o pai perguntou ao filho, futuro sambista, “se eu queria estudar filosofia, medicina ou engenharia”. Talvez quisesse ser poeta e escrevi alguns textos numa velha máquina italiana, enferrujada na dispensa da casa. Com os papéis dos primeiros poemas em mãos fui procurar o editor do “Correio das Artes”, Jurandy Moura, no sétimo andar no antigo prédio da reitoria (na lagoa).
Óculos fundo de garrafa, poeta da geração de 59 e jornalista, Jurandy excedeu o gesto de rotina de um editor – receber os poemas – e logo puxou conversa. Quis saber de por que poesia antes mesmo da leitura crítica dos poemas. A conversa terminou quase três horas depois.
Pertencia a uma geração de amigos de Jaguaribe que começava a se interessar por artes. Não tocava violão, era tímido, me interessei por literatura. A poesia em mim começou como um processo de introspecção, uma tentativa de viagem até últimos escaninhos da alma. Embora nunca mais (never more, never more) os tenha relido, tenho a impressão que meus primeiros poemas publicados no “Correio das Artes”, na quinzena seguinte à conversa com Jurandy, aparente certo desespero, que no fundo era um simples impasse juvenil. Nunca mais escrevi poemas. Somente retornei a escrevê-los, em migalhas, em 2007.
O fato é que publiquei regularmente no “Correio das Artes” entre 1977 e 1980. Foi o “período literário” de minha vida, que depois tomou outros rumos. Continuo gostando de três poemas relativamente longos daquele tempo – “Os rios e seus aflu/entes”, “Memória Escolar” e “Novas considerações do poema”, precisamente a produção que desborda do “desespero”.
Naquele tempo, as colaborações ao “Correio” eram remuneradas e nem tão irrisórias. Recordo de ter comprado livros e discos (de vinil) com o dinheirinho em cheque, apanhados no departamento financeiro de “A União”. Era quase um milagre a um poeta imberbe: ganhar dinheiro com poesia.
Longe de ser um mero detalhe, a atitude de remunerar os colaborados me parece índice do carinho do jornal para com o seu histórico suplemento literário. Mas me parece mais que isso. Quem se der à pachorra de ler os editoriais, escritos pela suave pena de Jurandy, perceberá que a insistência numa palavra repleta de significados – província.
Não é momento de fazer sociologia, contudo, para mim, a expressão província queria afirmar a existência de algo parecido com um sistema literário local. Talvez o sistema literário da província estivesse passando um período de transição, e se outras províncias literárias, parecidas com a paraibana, desapareceram, a “nossa província”, embora modificado, logrou continuidade e constituindo sistema. Os estudiosos deveriam se debruçar com mais afinco sobre o caso da longevidade do “Correio das Artes”.
Porém, mais que um sociólogo da literatura, precisa-se urgentemente de um garimpeiro dotado de mente aberta e erudição literária. Quantas relíquias desconhecidas, quantos contos e poemas, dormem em sono profundo nas páginas amareladas do “Correio das Artes”, à espera de alguém que faça a operação crítica de separar o joio do trigo. Em Borges, o sono é a morte e o sonho é a vida. (Jaldes Reis de Meneses).
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