A era Lula (I): política internacional

Pequeno artigo postado em minha coluna no Portal www.wscom.com.br.

Jaldes Reis de Meneses

É conhecida a imagem do Brasil como um país ciclotímico, que alterna comportamentos de euforia e depressão, de alto-astral e mal-estar. Esta característica do país contaminou até mesmo os clássicos do pensamento ensaístico sobre a nossa formação histórica, que pode ser dividido, entre dois exemplos, o dionisíaco Gilberto Freyre e as prédicas de uma nova civilização nos trópicos ao soturno Raymundo Faoro e a eterna viagem redonda ao ponto morto de começo do Brasil, a eterna dominação do Estado por uma espécie de patronato político que nunca cedeu milímetro de poder aos de baixo, senão como cooptação seletiva.´

Sem dúvida, nos últimos anos (a que chamamos de “era Lula”) vivemos um daqueles momentos de euforia, tanto que mesmo a crise econômica internacional e o decréscimo de 0,2 do PIB ano passado – em outras conjunturas combustível de uma grave crise política –, estão longe de estancar o nosso otimismo com o futuro. Resta indagar se vivemos um daqueles momentos de euforia que logo se esfumam, ou se há bases estruturais de sustentar a hipótese de que o Brasil enfim atravessou as cadeias da periferia do mundo capitalista. Nesta série de pequenos artigos, buscaremos fornecer subsídios à reposta da hipótese (observando que é impossível obter uma resposta conclusiva, definitiva, mas é possível captar tendências), ao mesmo tempo em que elucidamos elementos da história brasileira recente.

Um fato é certo: até nos anos noventa, compúnhamos um bloco estrutural comum com dois outros países da América Latina – o México e a Argentina –, contudo nos dias de hoje o volume bruto de nossa economia exportadora de grãos, auxiliado pelo crescimento do mercado interno, nos vem permitindo subir alguns degraus, criando uma situação nova, na qual o capitalismo brasileiro se instala num patamar junto com a China, a Índia e a Rússia.

A economia e a política se imbricam. Tal circunstância tem motivado a possibilidade de tentar formular uma política internacional cujo eixo não é mais precisamente o alinhamento automático aos Estados Unidos (Colômbia), mas de negociar posições geopolíticas, principalmente no hemisfério sul. A presença de tropas brasileiras no Haiti é o emblema mais evidente da estratégica de negociar posições. As inusitadas aproximações com a França, a amizade colorida com Sarkozy (às vistas de Carla Bruni), são um segundo índice revelador das intenções brasileiras, entre vários merecedores de citação, em especial a polêmica tomada de partido pelo Irã de Ahmadinejad e dos aiatolás, na queda de braço com a ONU sobre o real caráter - bélico ou pacífico - do programa nuclear iraniano, quando até a China parece se afastar dos aiatolás. Toda política implica, além de benefícios, custos: no caso da França o que tem havido é um abraço de temporada entre novos amigos, ambos com objetivos pontuais comuns, mas nada de longo prazo, ao passo que se for muito longe no apoio ao Irã - não valem os eufemismos retóricos de meutralidade de Celso Amorim - vão sobrepesar desconfianças sobre os compromissos democráticos do governo Lula.

Demais disso, se pensarmos a outra política internacional existente na América Latina, o bolivarianismo revolucionário de Hugo Chávez, como de confronto com os americanos, na medida em que ela é objeto de contestação aberta por forças internas na Venezuela, embora se consolidando o processo revolucionário num país economicamente atrasado como a Bolívia, na prática a estratégia chavista encontra-se na defensiva, na verdade mais servindo como reserva indireta dos objetivos da política internacional brasileira, pois o confronto à esquerda compõe a relação de forças de quem negocia ao centro.

Do ponto de vista das eleições presidenciais de 2010, o eleitor deve saber que pela primeira vez em tempos recentes haverá duas políticas internacionais claramente em confronto. A do alinhamento automático com os Estados Unidos, representado pelos tucanos (a atuação recente dos tucanos, principalmente na Comissão de Relacionais Exteriores do Senado deixa explícito a inflexão americanista tucana, inclusive em relação ao governo de FHC - pedágio pago ao DEM? -, período em que a amizade com os Cliton podia conviver com relações de convivência com Hugo Chávez) e a de negociar posições estratégicas, vinculada ao bloco político que gravita em torno do lulismo. Quanto ao bolivarianismo, ele é institucionalmente subrepresentado no Brasil, em que pese à presença ativa no MST e em alguns movimentos sociais.

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