Conservadorismo mudancista

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No presente momento, data do prazo final das coligações partidárias, as principais atenções do mundo político estão voltadas para os acertos das chapas majoritárias de governador e senador, com pouca ou nenhuma atenção para as chapas proporcionais de deputados. Trata-se de uma arraigada e persistente tradição brasileira e um grave equívoco analítico, pois o mapa da correlação de forças políticas só pode ser considerado completo examinando, mais além das coligações majoritárias, o jogo mais disperso de quem será eleito para a Câmara Federal, as Assembléias Legislativas (a que se deve somar o Senado Federal, eleito majoritariamente).

Avento algumas hipóteses sobre as eleições deste ano, tendo em vista as eleições parlamentares. Atualmente, são quatro os grandes partidos brasileiro em termos de representação parlamentar (PMDB, PT, DEM e PSDB). As urnas de 2010 deverão reduzir o número dos grandes partidos a três. É praticamente certo – principalmente em termos de bancada federal –, que o DEM desça alguns degraus da escala e se transforme em mais um dos muitos partidos médios brasileiros, junto com o PP, PR, PDT e PTB, no qual a competição pela sobrevivência é acirrada, contudo, efetivamente, são siglas absolutamente caudatárias do jogo principal encenado pelos grandes partidos. O fenômeno do DEM é curioso: a tentativa de renovação a partir da idéia de constituir um grande partido conservador brasileiro se transformou num pesadelo e precisamente os partidos que viviam ao seu redor quando do processo de reorganização partidária de 1985 (época da chamada “nova República”), PP (ex-PDS), PR (ex-PL) e PTB (o PDT é outra história) vão virar concorrentes pelo mesmo exíguo espaço político.

Por que a aposta do DEM não rendeu frutos? Múltiplas hipóteses podem ser sustentadas, mas a principal é que o conservadorismo brasileiro (ao inverso do francês, inglês, americano e espanhol) carece da base popular necessária a montagem de um partido de massas. O nosso conservadorismo tem peso estrutural, vai do capital financeiro ao agronegócio exportador, porém continua disperso em várias siglas e parece gostar mais de se reunir pontualmente em frente ampla do que se concentrar ao abrigo de uma única bandeira. Para complicar, o próprio lulismo (diferencio do PT do lulismo, um fenômeno mais amplo) consegue uma amálgama que cativa e compõe o próprio conservadorismo, tanto o de elite como o senso comum popular (onde a muito de conservadorismo: espontâneo, evidentemente).

Sem o DEM à cola, o PSDB se enfraquece – mesmo que eleja uma boa base parlamentar em São Paulo e Minas Gerais, principalmente. Na quadra vindoura, o núcleo do poder brasileiro deverá estar nas mãos da coligação PT-PMDB. Por que mais seja verdadeiro observar que o PMDB é mais um amontoado de lideranças regionais do que propriamente um partido, no atual processo eleitoral, ele tem se apresentado mais unido e centralizado. Sem dúvida, quanto ao PMDB, existem as clássicas dissidências de São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Pernambuco, mas estas estão isoladas em um cordão sanitário, que será devidamente arrochado caso Dilma Rousseff confirme nas urnas o favoritismo das pesquisas eleitorais.

De alguma maneira, o núcleo de poder PT-PMDB vem operando no parlamento e no governo a um bom tempo, sob a clara direção política do poder unipessoal e carismático de Lula. Defino essa política, paradoxalmente, como conservadora-mudancista. O verdadeiro fiador da existência desse núcleo é a duração do crescimento econômico; portanto, a mudança. Contudo, muitas das forças que lhe dão suporte representam atraso político e até interesses improdutivos e rentistas existente na própria estrutura econômica; portanto conservadorismo. Embora seja uma situação modificada, quem conhece a história do Brasil sabe que o crescimento econômico na chamada “era Vargas” ocorreu de maneira parecida: o processo de industrialização foi feito sem mexer na estruturas rurais. Enquanto se pode ir para frente com base na situação esdrúxula, foi-se, até o acordo romper na paradigmática crise de 1964.

Dilma não é Lula, e caso eleita, vamos ver como se comporta como direção política e fiadora, mais que do governo, da própria armação estrutural de forças do Estado e do parlamento, ainda mais em se sabendo que o crescimento econômico não é eterno, e quando a economia emperra, sobrevém a crise. (Jaldes Reis de Meneses).

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