Corrupção à brasileira


Artigo publicado em versão resumida na minha coluna quinzenal do Jornal da Paraíba, em 13 de maio de 2012.

Jaldes Reis de Meneses

O repúdio amplo, geral e irrestrito ao senador Demóstenes Torres (DEM), cuja reputação foi tragada nas denúncias de relações promíscuas com o bicheiro Carlinhos Cachoeira, levou às manchetes um tema que jamais saiu da ribalta – a corrupção –, mas esteve eclipsado por um bom tempo pelas boas notícias da economia desde os tempos da “crise do mensalão” (2005), porém, antes, quase pôs a pique o governo Lula e o PT.


No final do semestre, agravado pelos trabalhos da nova CPI do Cachoeira (uma reedição atualizada, digital, para o terceiro milênio, da antiga “CPI do orçamento”, analógica), sempre imprevisíveis, o espectro do “mensalão” deve voltar à baila, com a iminência de julgamento no supremo. A conjunção da CPI com o julgamento do “mensalão” sem dúvida arma insumos de uma crise política (os boletins da ABIN devem começar a chegar em tom preocupado à mesa de Dilma), cujo desfecho imprevisível (micro ou macro) deve-se aguardar. Ainda mais, para complementar o cenário, a presidente deve enfrentar nos próximos dias a primeira onda de greves do funcionalismo público federais em seu governo. Vamos ver como será o comportamento do governo diante do assédio da CPI e dos grevistas, posto que a mecânica armada nos tempos da era Lula começa a desatualizar.

Chegamos a meados de maio e a agenda começa a superlotar. Por enquanto, antes de tratar da agenda "cheia" em outra oportunidade, ficarei na análise tópica das reações do senso comum e do discurso político dos aproveitadores (dois grupos de interesses bastante assanhados), relativo à corrupção. Novamente no Brasil, a reação às denúncias circunscreve duas atitudes interessadas: uma indignada e outra condescendente, cuja versão mais sofisticada atribui o repúdio à corrupção como “udenismo moral” de uma classe média de horizontes políticos limitados. Ambas as posições – tanto a indignada como a condescendente – têm dificuldades em situar de maneira consistente a corrupção.

Aos indignados, lembro que paradoxalmente o senador Demóstenes era um de suas lideranças mais indignadas, revelando que sentar praça no discurso da corrupção e das mordomias tem sido uma das formas mais persistentes da demagogia (os jornalistas de nariz de Pinóquio adoram a este discurso). Quanto aos condescendentes, não sejamos ingênuos: eles procuram plantar uma construção discursiva arbitrária da história do Brasil (o massacre elitista do populismo intrínseco do período Vargas como uma espécie de longa duração) que justifique os “bons motivos” sociais e políticos da bandalheira, como se isso fosse possível. Ambas as versões mistificam o Brasil.

São duas as corrupções existentes no Brasil: a nova e a antiga, a primeira, arcaica, de tipo patrimonialista, e a segunda, moderna, capitalista. Embora diferentes, as duas convivem muito bem, configurando a estrutura da corrupção à brasileira.

Trata-se de engano pensar que simplesmente se produzindo riqueza e desenvolvendo o país, a corrupção vai acabar, ou seja, que os setores modernos da economia brasileira – os empresários empreendedores e os investidores internacionais – estão imunes ao vírus da corrupção. Ao contrário, o capital corporativo desconhece fronteiras entre o legal e o ilegal – tanto que toda regulação que realmente funciona no sistema é público-estatal. O capitalismo avançado, e não o só o coronelismo antigo, contém os germens da corrupção, como atestam os balanços maquiados dos fundos de investimento imobiliário, na crise de 2008, nos Estados Unidos.

Que fazer? Pensar a corrupção brasileira como um mecanismo estrutural está longe de justificá-la. Embora os mecanismos da corrupção sejam de estrutura, elas precisam das mãos inescrupulosas de um agente. Pegos em fragrante, devem ser exemplarmente punidos. Não há estruturas sem sujeito.

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