Vanderley Caixe
Jaldes Reis de Meneses
Recebi com atraso de quase um dia, através de uma nota comovida da professora de Letras da UFPB Wilma Mendonça, a notícia da morte em São Paulo de Vanderley Caixe, advogado, mas principalmente uma personalidade histórica das lutas sociais na Paraíba no duro período dos anos de chumbo da ditadura militar, quando dos heróicos anos setenta.
Entristece-me que, afora o fluxo frenético das redes sociais, no qual uma postagem sai de cena em poucos segundos, ainda não vislumbrei na imprensa paraibana um interesse investigatório de elucidação às novas gerações de quem foi Vanderley, nem nos partidos e sindicatos sequer uma nota pública. Ironicamente, numa conjuntura na qual os dois partidos de esquerda, o PSB e o PT, governa o primeiro, ou está na iminência de governar o segundo, Estado e Prefeitura da capital, parece se passar involuntariamente uma borracha no passado das lutas sociais que foram o começo desse processo de construção de hegemonia. Não há hegemonia se fazendo tabula rasa do passado. Se a esquerda é vitoriosa na Paraíba, através dos nomes de Ricardo Coutinho e Luciano Cartaxo, não se deve esquecer que ela é tributária do esforço abnegado de heróis da estripe de Vanderley. É impossível escrever a respeito das lutas sociais da Paraíba sem dedicar um capítulo ao Presidente da antiga Comissão de Direitos Humanos da Arquidiocese da Paraíba nos tempos de Dom José Maria Pires – repito o nome para que seja gravado –, Vanderley Caixe.
Dom José e Vanderley são personagens de epopéia. Creio que tenha sido no remoto ano de 1975 que Dom José trouxe à luz do dia da atuação legal na Paraíba, importando, um recém preso político saído da cadeia, acusado de preparar uma guerrilha contra a ditadura em Ribeirão Preto. Em atitude audaciosa, Dom “Pelé” deu um emprego total e absolutamente político a um jovem advogado inteligente, mas especialmente dotado de imensa coragem – presidir a Comissão de Direitos Humanos da Arquidiocese da Paraíba. Logo que chegou a seu novo destino, Vanderley se embrenhou desarmado e dirigindo um jeep velho pelos imensos canaviais solitários de nossos latifúndios, sujeito aos perigos de uma emboscada traiçoeira, organizando os trabalhadores do campo, naquele tempo fundamental, de processo de transformação de camponeses estropiados em assalariados bóias-frias do Proálcool, o programa do Governo Geisel que capitalizou momentaneamente o mundo rural brasileiro, inclusive o Paraibano. Vanderley morreu ontem, mas poderia ter morrido há trinta e cinco anos...
Não fui amigo pessoal de Vanderley Caixe, feito Wilma Mendonça. Tive, porém, a ventura de ter compartilhado de perto com ele duas experiências fundamentais à minha formação. A primeira, as reuniões de todas as sextas-feiras à noite, em 1981, na qual comparecia representando o Jornal Tribuna Operária, na nova sede do Centro de Defesa e Direitos Humanos/Assessoria e Educação Popular, inicialmente na Duque de Caxias e depois na Almirante Barroso. Ele criou o novo centro após ter rompido amigavelmente com a Diocese. Naquela sede foram realizadas talvez muitas das primeiras articulações do movimento feminista e de lideranças de bairro de nossa cidade. A segunda, a participação na bela campanha eleitoral de 1982 do Bloco Popular do PMDB. A bem da verdade, PCdoB mais prestistas, composta da chapa Simão Almeida, deputado estadual, e Vanderley Caixe, deputado federal, que não elegeu nenhum dos dois. Contudo, ambos tiveram votações expressivas. Vanderley angariou 14 mil votos e conquistou a primeira suplência de deputado federal, Simão, por seu turno, também primeiro suplente, recebeu mais de 9 mil votos. Foram votos suados, ideológicos, dos jovens e dos trabalhadores, de militância sem hora. Abandonando o PMDB, em seguida Vanderley tentaria uma nova incursão eleitoral: foi o primeiro candidato do PT a prefeito de João Pessoa, em 1985. Nos anos noventa, sem espaços na Paraíba, voltou a residir em São Paulo. Talvez esteja enganado, mas aqui ele viveu certamente muitas de suas experiências mais prazerosas, pois quando se faz grande política se obtém junto a química do prazer.
Vanderley Caixe não morreu. Apenas seu coração deixou de bater.
Recebi com atraso de quase um dia, através de uma nota comovida da professora de Letras da UFPB Wilma Mendonça, a notícia da morte em São Paulo de Vanderley Caixe, advogado, mas principalmente uma personalidade histórica das lutas sociais na Paraíba no duro período dos anos de chumbo da ditadura militar, quando dos heróicos anos setenta.
Entristece-me que, afora o fluxo frenético das redes sociais, no qual uma postagem sai de cena em poucos segundos, ainda não vislumbrei na imprensa paraibana um interesse investigatório de elucidação às novas gerações de quem foi Vanderley, nem nos partidos e sindicatos sequer uma nota pública. Ironicamente, numa conjuntura na qual os dois partidos de esquerda, o PSB e o PT, governa o primeiro, ou está na iminência de governar o segundo, Estado e Prefeitura da capital, parece se passar involuntariamente uma borracha no passado das lutas sociais que foram o começo desse processo de construção de hegemonia. Não há hegemonia se fazendo tabula rasa do passado. Se a esquerda é vitoriosa na Paraíba, através dos nomes de Ricardo Coutinho e Luciano Cartaxo, não se deve esquecer que ela é tributária do esforço abnegado de heróis da estripe de Vanderley. É impossível escrever a respeito das lutas sociais da Paraíba sem dedicar um capítulo ao Presidente da antiga Comissão de Direitos Humanos da Arquidiocese da Paraíba nos tempos de Dom José Maria Pires – repito o nome para que seja gravado –, Vanderley Caixe.
Dom José e Vanderley são personagens de epopéia. Creio que tenha sido no remoto ano de 1975 que Dom José trouxe à luz do dia da atuação legal na Paraíba, importando, um recém preso político saído da cadeia, acusado de preparar uma guerrilha contra a ditadura em Ribeirão Preto. Em atitude audaciosa, Dom “Pelé” deu um emprego total e absolutamente político a um jovem advogado inteligente, mas especialmente dotado de imensa coragem – presidir a Comissão de Direitos Humanos da Arquidiocese da Paraíba. Logo que chegou a seu novo destino, Vanderley se embrenhou desarmado e dirigindo um jeep velho pelos imensos canaviais solitários de nossos latifúndios, sujeito aos perigos de uma emboscada traiçoeira, organizando os trabalhadores do campo, naquele tempo fundamental, de processo de transformação de camponeses estropiados em assalariados bóias-frias do Proálcool, o programa do Governo Geisel que capitalizou momentaneamente o mundo rural brasileiro, inclusive o Paraibano. Vanderley morreu ontem, mas poderia ter morrido há trinta e cinco anos...
Não fui amigo pessoal de Vanderley Caixe, feito Wilma Mendonça. Tive, porém, a ventura de ter compartilhado de perto com ele duas experiências fundamentais à minha formação. A primeira, as reuniões de todas as sextas-feiras à noite, em 1981, na qual comparecia representando o Jornal Tribuna Operária, na nova sede do Centro de Defesa e Direitos Humanos/Assessoria e Educação Popular, inicialmente na Duque de Caxias e depois na Almirante Barroso. Ele criou o novo centro após ter rompido amigavelmente com a Diocese. Naquela sede foram realizadas talvez muitas das primeiras articulações do movimento feminista e de lideranças de bairro de nossa cidade. A segunda, a participação na bela campanha eleitoral de 1982 do Bloco Popular do PMDB. A bem da verdade, PCdoB mais prestistas, composta da chapa Simão Almeida, deputado estadual, e Vanderley Caixe, deputado federal, que não elegeu nenhum dos dois. Contudo, ambos tiveram votações expressivas. Vanderley angariou 14 mil votos e conquistou a primeira suplência de deputado federal, Simão, por seu turno, também primeiro suplente, recebeu mais de 9 mil votos. Foram votos suados, ideológicos, dos jovens e dos trabalhadores, de militância sem hora. Abandonando o PMDB, em seguida Vanderley tentaria uma nova incursão eleitoral: foi o primeiro candidato do PT a prefeito de João Pessoa, em 1985. Nos anos noventa, sem espaços na Paraíba, voltou a residir em São Paulo. Talvez esteja enganado, mas aqui ele viveu certamente muitas de suas experiências mais prazerosas, pois quando se faz grande política se obtém junto a química do prazer.
Vanderley Caixe não morreu. Apenas seu coração deixou de bater.
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