Hugo Chávez

Jaldes Reis de Meneses

O tenente-coronel Hugo Chávez (1954-2013) morreu como em vida, atraindo multidões às ruas e dividindo opiniões. Para explicar os dilemas em vida do falecido presidente venezuelano, alguns insistem em recuperar a desgastada metáfora do labirinto de Gabriel García Márquez. O General do romance de García Márquez morreu decadente, ao passo que as exéquias de Chávez recuam no século XXI às imagens dos enterros de lideranças do passado na América Latina, a exemplo de Perón e Vargas. A comoção vivida na Venezuela derruba a opinião de que não haveria futuro ao regime sem a presença física de Chávez. As multidões nas ruas demonstram que o chavismo segue, e Chávez, parafraseando a carta-testamento de Vargas, saiu da vida e entrou na história.

Espécie de capitão Lamarca que deu certo, Chávez chegou ao poder despertando
 esperanças por que soube detectar o cerne da luta política venezuelana: o conflito distributivo entre os setores diretamente envolvidos na cadeia produtiva da economia do petróleo e a maioria da população. Tomou o partido dos excluídos na distribuição dos excedentes do petróleo, alijados da parte de leão da economia não somente pela superexploração do trabalho, como também do acesso à qualificação técnico-gerencial da indústria do petróleo (monopolizado por certa classe média treinada nas universidades e no exterior), privativo das classes elegantes. Neste caso, a racionalidade econômica propagandeada no discurso elegante do antigo regime funcionava a favor dos sofisticados (e americanizados) habitantes de El Chacal (bairro luxuoso de Caracas, mais sofisticado que os nossos jardins), em detrimento do povão desqualificado das favelas. Chávez inverteu os termos da estratificação de classes da Venezuela.

De todos os plebiscitos e referendos que submeteu à população venezuelana, Chávez foi derrotado em apenas um, relevando as limitações do bolivarianismo: o plebiscito de 2008, que propunha as medidas socializantes do projeto do “socialismo no século XXI”. Apóia-se o redistributivismo, mas faltou adesão às medidas de estatização e nacionalização dos meios de produção, para além do capital, proposta que teve menos votos que o número de militantes do partido chavista, o PSUV. Trotsky diria que a "revolução permanente" empacou na Venezuela. O fantasma do “passo adiante” socialista acossará novamente o regime bolivariano? Resta saber se Nicolás Maduro tem vocação de Hamlet (o hesitante príncipe shakespeariano) ou César Bórgia (o príncipe maquiavelino da vontade).

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