A lógica do protesto
Jaldes
Meneses
Há dias
que valem anos. Mais de um milhão de pessoas já foram às ruas de norte a sul, e
nada disso acontece impunemente. Em duas semanas, a sociedade nas ruas mudou a
correlação de forças políticas no Brasil, basta ver o conteúdo das
reivindicações, com uma nítida inflexão à esquerda. Ainda mais: ou Dilma faz
uma inflexão também à esquerda, ou irá ao buraco com Collor, Sarney, Renan e
outros cadáveres políticos que lhe dão sustentação.
Diz-se que os protestos que estão virando o Brasil
de cabeça para baixo não têm objetivos claros. Engano ou preconceito. O
protesto tem juízo. A síntese da pauta das maiores manifestações brasileiras
desde o “fora Collor” (19992) é simples e de comunicação imediata: quer-se
tarifa zero nos transportes coletivos, é-se contra os gastos e as negociatas na
Copa do Mundo (29 bilhões de reais) e nas Olimpíadas e propõe-se que o dinheiro
público deveria ser aplicado em saúde e educação. Propõe-se uma inversão nas
prioridades de gastos do Estado. Pauta mais transparente, impossível.
Em 2008, visando escapar da crise internacional, o
governo Lula programou um modelo de desonerações fiscais a indústria automobilística,
aumentando ainda mais o inferno dos que vivem nas cidades. Decididamente, o
modelo industrial baseado no automóvel individual esgotou-se no Brasil. O país
literalmente parou. Há que se fazer uma revolução cultural no transporte
público, no qual o cidadão de classe média deve ser persuadido, assim como na
Europa, de que índice de civilização não é exibir o automóvel do ano, mas faze
uso e cobrar por serviços de transporte de qualidade.
Verdade que desde 2003, após a vitória de Lula e
continuado por Dilma, ocupa o poder político brasileiro um bloco de poder de
forças advindas da esquerda, que distribuiu renda e diminuiu através de uma
política de aumento do salário mínimo, estímulo ao crédito e de transferência
de rendas aos pobres e miseráveis. Mas o programa do Lulismo, de cunho
produtivista e neodesenvolvimentista, antes empreender um reformismo radical,
deve ser caracterizado como de “reformismo fraco”, que não mexe nas estruturas
nem na cultura política, antes acomoda os interesses.
Dilma, Lula e o PT já não podem escapar da tarefa,
depois de 10 anos de poder, de fazer a passagem do que denomino de “reformismo
fraco” para “reformismo forte”, o que exige novas alianças e um novo programa
político. Se não tiverem a coragem de fazer a passagem de um reformismo a
outro, o bloco lulista no poder estará fadado a abrir o leque de alternativas
políticas e outras forças emergirão a ribalta.
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