As Paixões do Mensalão


Jaldes Meneses[1]

Nunca fui viúva de José Dirceu nem fã de Joaquim Barbosa. Jamais me animei em participar dos dois partidos organizados em torno da defesa ou acusação no processo do mensalão, seja como escriba intelectual no estilo de um Wanderley Guilherme dos Santos (denunciador exagerado da perspectiva iminente de “um golpe da mídia”) ou de um Reinaldo Azevedo (criador no neologismo “petralha”, do petista que tenta justificar o roubo de recursos públicos para fins políticos). As redes sociais estão repletas dessas pessoas, reiterando em ação todos os mecanismos, descritos por Marx, da ideologia como estado bruto de “falsa consciência”.
As pessoas se comportam nos debates (de que o ruído das redes sociais é pródigo) a partir de convicções profundas e sinceras, no mais das vezes filiadas emocionalmente ao passado, atadas de maneira acrítica aos tempos idos, das passeatas contra a ditadura que contamos a nossos filhos e netos. O principal patrimônio do PT não se resume a suas realizações físicas, nem no bolsa-família nem no crédito consignado, mas exatamente neste verdadeiro exército gratuito, a narrativa de uma geração que nenhum partido outro possui no Brasil.
Por outro lado, a simpatia difusa agregada em torno das atitudes de Joaquim Barbosa, na ausência de organicidade da oposição, reuniu em suas hostes o mal-estar de um setor das classes médias (não se trata de toda a classe média, como pensa erroneamente Marilena Chauí) contra as políticas de transferência de renda ou o fato de os membros do PT, se pertencem indiscutivelmente às elites sindicais e políticas, estão longe de compor o núcleo duro da economia. No fundo, para estes, por vício de origem, Lula e seus companheiros, jamais passarão de convidados forçados à festa. Por muito que façam, jamais serão dos seus.
Atuando mais em circuito fechado de reiteração que expansivamente em diálogo com as novas camadas sociais, a exemplo da juventude das Jornadas de Junho, as duas torcidas organizadas – principalmente a das viúvas de José Dirceu, originária da esquerda –, por mais que neguem, reiteram o pacto conservador. André Singer, um insuspeito petista, no livro “Os sentidos do lulismo” denomina a este conservadorismo de “reformismo fraco”. Marcos Nobre, outro intelectual neopetista, em “Imobilismo em movimento”, um livro do momento, cunhou o termo pemedebismo, expressando que o PT dirige hoje, com batuta de maestro, o conservadorismo e o fisiologismo brasileiro, raízes de nossos mensalões ancestrais.

[1] Professor Associado do Departamento de História (UFPB). e-mail: jaldesm@uol.com.br.

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