Falácias do conservadorismo


Coxinhas bem asseados, nossos conservadores precisam estudar mais. 
Jaldes Meneses
            Osvaldo Aranha, o lendário conspirador junto com Getúlio Vargas da revolução de 1930, embaixador nos Estados Unidos no período do Estado Novo, costumava dizer que “no Brasil as ideias costumam demorar a passar na alfândega”. Sempre me lembro dessa frase quando converso com pessoas politizadas – até acadêmicos da área de política –, e absolutamente ignorantes da existência de uma escola densa de pensamento conservador moderno, o que diz mais respeito ao baixo nível de nosso ensino universitário do que propriamente a uma hegemonia consolidada de esquerda. Nunca se pode ser hegemônico ignorando, mas conhecendo e fazendo a crítica por dentro.
A vertente do pensamento conservador moderno surge na polêmica contra a revolução francesa de 1789, especialmente a crítica dos “direitos do homem” a partir do livro-marco de Edmund Burke “Reflexões sobre a revolução na França”, publicada no ano seguinte da revolução. O livro provocou uma resposta clássica do artesão-filósofo iluminista Thomas Paine, que participou das revoluções americana e francesa. Nas páginas de polêmica PaineXBurke, encontra-se o cerne das questões mais importantes do direito na modernidade. Outra crítica bastante conhecida ao conservadorismo é o ensaio de um dos cientistas sociais mais perspicazes do século XX, Albert Hirschman, “Retórica da intransigência – perversidade, futilidade, ameaça”.
Na oposição a 12 anos de PT no poder, surgiu no Brasil a tentativa de implantar um grupo alinhando ao conservadorismo, com grande audiência de mídia. Gramsciano - vale a pena anotar de passagem: dos grandes autores da tradição marxista, foi exatamente Gramsci aquele que atravessou e fez a crítica por dentro ao conservadorismo -, ao comprar o livro recém-lançado do colunista lusitano da Folha de S. Paulo, João Pereira Coutinho, “As ideias conservadoras” (Ed. Três Estrelas) já intuía ele teria a obrigação de responder às críticas de Paine e Hirschman. Dito e feito.
As repostas são decepcionantes. Coutinho omite que a diferença entre Paine e Burke remetia à defesa iluminista do caráter universal dos direitos do homem, a que o conservadorismo se opunha. Na contrafeita a Hirschman, por outro lado, Coutinho desistoriciza o pensamento de seu oponente, vulgarizado em termos de “características formais”, quando o alvo do sociólogo são as campanhas de medo do conservadorismo em três retóricas históricas “perversidade da revolução” (Burke, século XIX), “futilidade da revolução” (Tocqueville, século XIX) e “ameaça” (neoliberalismo, século XX).
Coxinhas bem asseados, nossos conservadores precisam estudar mais. 

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