As ideias de Bresser-Pereira
Jaldes Meneses
Estivemos, um grupo de intelectuais e políticos paraibanos, em duas demoradas e animadas conversas na semana passada com o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira (Fazenda no governo Sarney; Administração e Ciência e Tecnologia no governo Fernando Henrique), cujos assuntos, não podiam deixar de ser, foram economia, política e história do Brasil.
Impressiona a vitalidade e o bom humor de Bresser-Pereira aos 81 anos, um desses homens socráticos - são poucos - que expõem com paixão, mas perguntam e sabem escutar, inclusive as críticas e ponderações. Na idade em que muitos deitam na cama da fama, nosso interlocutor ocasional, enfim intelectual full time, em vez de simplesmente colher os frutos doces de um passado de vida de ex-ministro e professor emérito da Fundação Getúlio Vargas, ao reverso, resolveu enveredar no mar aberto de duas pesquisas científicas conjugadas, polêmicas e ambiciosas: 1) propôs-se a formular uma nova teoria macroeconômica, por ele chamada de “novo desenvolvimentismo”, de repercussão acadêmica internacional (“Developmental Macroeconomics”, London: Routledge, 2014) e; 2) se definindo como nacionalista brasileiro partiu para a formulação de uma nova teoria histórica e política do Brasil (“A construção política do Brasil", São Paulo: ed. 34, 2015).
Em termos de teoria política, formulei a questão a ele para começo de conversa, a ideia de "novo desenvolvimentismo”, embora de nomenclatura e origem intelectual distinta (não se pode definir Bresser como marxista), me parece aproximar politicamente das formulações de esquerda de Armando Boito (UNICAMP). Para quem não conhece, Boito trata-se de um intelectual marxista de origem maoísta e althusseriana -, que interpretou o período Lula-Dilma em termos de “neodesenvolvimentismo", ou seja, com base em categorias de Poulantzas (um autor que aprecio), sugeriu haver ali uma experiência de governo de hegemonia da “burguesia interna” brasileira e de criação de uma “frente política”, na qual os pobres participam como “classe apoio” e a burguesia brasileira como classe dirigente.
Um parêntesis. Antes de comentar as formulações de Boito, Bresser anotou que obviamente ele não é marxista, mas um “nacionalista de origem na velha escola do ISEB". Citando nominalmente os “Grundrisse" e "O Capital”, considerados por ele “obras insuperáveis”, afirmou que Marx era “o maior e mais erudito economista de todos os tempos”, uma inesgotável fonte de conhecimentos. Fecha parêntesis.
Bresser disse apreciar muito a análise de Boito; nem poderia ser diferente, afirmei. Contudo, observou que Boito faz uma análise sociológica do período Lula-Dilma, enquanto ele se propõe a uma nova formulação macroeconômica e uma teoria histórica e política. Enveredou por esses caminhos quando saiu do governo FHC e detectou, na matriz neoliberal daquele governo, uma ancestralidade na teoria da dependência do amigo, publicada em 1970, em parceria com o sociólogo chileno Enzo Faletto. Para FHC, em resumo, dependência quer dizer “dependência-associada”, ou seja, engajamento na internacionalização pura e simples do capitalismo brasileira e latino-americano, não simplesmente como crítica, mas plano de ação.
Estivemos, um grupo de intelectuais e políticos paraibanos, em duas demoradas e animadas conversas na semana passada com o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira (Fazenda no governo Sarney; Administração e Ciência e Tecnologia no governo Fernando Henrique), cujos assuntos, não podiam deixar de ser, foram economia, política e história do Brasil.
Impressiona a vitalidade e o bom humor de Bresser-Pereira aos 81 anos, um desses homens socráticos - são poucos - que expõem com paixão, mas perguntam e sabem escutar, inclusive as críticas e ponderações. Na idade em que muitos deitam na cama da fama, nosso interlocutor ocasional, enfim intelectual full time, em vez de simplesmente colher os frutos doces de um passado de vida de ex-ministro e professor emérito da Fundação Getúlio Vargas, ao reverso, resolveu enveredar no mar aberto de duas pesquisas científicas conjugadas, polêmicas e ambiciosas: 1) propôs-se a formular uma nova teoria macroeconômica, por ele chamada de “novo desenvolvimentismo”, de repercussão acadêmica internacional (“Developmental Macroeconomics”, London: Routledge, 2014) e; 2) se definindo como nacionalista brasileiro partiu para a formulação de uma nova teoria histórica e política do Brasil (“A construção política do Brasil", São Paulo: ed. 34, 2015).
Em termos de teoria política, formulei a questão a ele para começo de conversa, a ideia de "novo desenvolvimentismo”, embora de nomenclatura e origem intelectual distinta (não se pode definir Bresser como marxista), me parece aproximar politicamente das formulações de esquerda de Armando Boito (UNICAMP). Para quem não conhece, Boito trata-se de um intelectual marxista de origem maoísta e althusseriana -, que interpretou o período Lula-Dilma em termos de “neodesenvolvimentismo", ou seja, com base em categorias de Poulantzas (um autor que aprecio), sugeriu haver ali uma experiência de governo de hegemonia da “burguesia interna” brasileira e de criação de uma “frente política”, na qual os pobres participam como “classe apoio” e a burguesia brasileira como classe dirigente.
Um parêntesis. Antes de comentar as formulações de Boito, Bresser anotou que obviamente ele não é marxista, mas um “nacionalista de origem na velha escola do ISEB". Citando nominalmente os “Grundrisse" e "O Capital”, considerados por ele “obras insuperáveis”, afirmou que Marx era “o maior e mais erudito economista de todos os tempos”, uma inesgotável fonte de conhecimentos. Fecha parêntesis.
Bresser disse apreciar muito a análise de Boito; nem poderia ser diferente, afirmei. Contudo, observou que Boito faz uma análise sociológica do período Lula-Dilma, enquanto ele se propõe a uma nova formulação macroeconômica e uma teoria histórica e política. Enveredou por esses caminhos quando saiu do governo FHC e detectou, na matriz neoliberal daquele governo, uma ancestralidade na teoria da dependência do amigo, publicada em 1970, em parceria com o sociólogo chileno Enzo Faletto. Para FHC, em resumo, dependência quer dizer “dependência-associada”, ou seja, engajamento na internacionalização pura e simples do capitalismo brasileira e latino-americano, não simplesmente como crítica, mas plano de ação.
Interessante,
disse ao interlocutor, que ele tardiamente tenha como ponto de chegada
histórico e nova partida de sua formulação, a essa importante conclusão teórica e
política. Sempre foi evidente na leitura das obras de FHC, nem falo de
“Dependência e desenvolvimento na América Latina”, mas de anteriores, a exemplo
das pesquisas, já antes de 1964, sobre “Empresário industrial e desenvolvimento
econômico” (Ed Zahar, 1964). Nesta obra, hoje clássica, FHC havia concluiu que
a “burguesia nacional” dos manifestos do PCB e dos nacionalistas não
correspondia, em termos ideológicos, à burguesia empírica de suas pesquisas com
os empresários concretos. A burguesia em formação era brasileira por condição
geográfica – aqui nasceu e prosperou -, mas não estava preocupada com um
projeto nacional. Ao0 contrário, até medo tinha da aliança nacionalista
proposta com as classes populares, o eterno drama da política brasileira
reformista.
Bresser-Pereira leu e compreendeu perfeitamente o livro de FHC sobre os empresários, de sorte que não falava novidade. Contudo, realmente, somente depois de 2000 pôde extrair todas as consequências históricas, econômicas e políticas do debate da dependência. Em seguida, fez uma análise, que me pareceu muito criativa, da questão das classes sociais. Citei uma passagem da excepcional biografia de Getúlio Vargas, de Lira Neto. Conta Lira que em 1935, informando pelo serviço secreto inglês, da presença clandestina de Prestes do Rio de Janeiro e as movimentações do PCB nos quartéis, o presidente reúne a nata do empresariado brasileiro. Queria ajuda no combate ao iminente “golpe comunista”. Os maiores empresários brasileiros não dão a mínima às preocupações de Getúlio. Logo começa a pedir subsídios públicos, favores para isso e aquilo.
Que burguesia é essa? Bresser-Pereira disse mais ou menos o seguinte (cito de memória) – releia Poulantzas, sobre as classes sociais: para isso é existe o Estado e a importância da política, do próprio Vargas, a burguesia como classe em formação sempre será majoritariamente corporativa. Poderia indagar, em seguida, se existe, hoje, espaço de “formação” da burguesia brasileira. Mas passava de 4 da tarde, o professor faria uma palestra de abertura no Encontro Nacional de Estudantes em Gestão Pública, na UFPB, às 8, e o professor precisava descansar.
Bresser-Pereira leu e compreendeu perfeitamente o livro de FHC sobre os empresários, de sorte que não falava novidade. Contudo, realmente, somente depois de 2000 pôde extrair todas as consequências históricas, econômicas e políticas do debate da dependência. Em seguida, fez uma análise, que me pareceu muito criativa, da questão das classes sociais. Citei uma passagem da excepcional biografia de Getúlio Vargas, de Lira Neto. Conta Lira que em 1935, informando pelo serviço secreto inglês, da presença clandestina de Prestes do Rio de Janeiro e as movimentações do PCB nos quartéis, o presidente reúne a nata do empresariado brasileiro. Queria ajuda no combate ao iminente “golpe comunista”. Os maiores empresários brasileiros não dão a mínima às preocupações de Getúlio. Logo começa a pedir subsídios públicos, favores para isso e aquilo.
Que burguesia é essa? Bresser-Pereira disse mais ou menos o seguinte (cito de memória) – releia Poulantzas, sobre as classes sociais: para isso é existe o Estado e a importância da política, do próprio Vargas, a burguesia como classe em formação sempre será majoritariamente corporativa. Poderia indagar, em seguida, se existe, hoje, espaço de “formação” da burguesia brasileira. Mas passava de 4 da tarde, o professor faria uma palestra de abertura no Encontro Nacional de Estudantes em Gestão Pública, na UFPB, às 8, e o professor precisava descansar.
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