Votos vendidos
Jaldes
Meneses
A
grande marca histórica do Brasil é que o nosso país jamais passou por um
processo de revolução burguesa em termos clássicos, de ruptura com o antigo
regime senhorial e patrimonialista. Nos termos de Florestan Fernandes, em "A revolução Burguesa no Brasil, o nosso país viveu um acelerado processo de transformação capitalista – principalmente
depois de 1930 –, no qual a presença do espectro da revolução política se fez
na forma contraditória das sombras da ausência.
Embora
esteja longe de abranger toda a realidade, nossos modelos de análise, portanto,
não devem desprezar as categorias do período da República Velha – a vigência do
coronelismo e das oligarquias. Ninguém vai passar pelo vexame do anacronismo. Subsiste
uma parte de verdade na análise de resistência de uma parte deletéria do
passado: em tempos de rede sociais, as práticas oligárquicas continuam vivas,
especialmente nos períodos de campanha eleitoral.
Mais
além da distância de um século, há uma diferença essencial entre a Paraíba no
começo do século XXI e a remota fase áurea do domínio dos coronéis. Antes de
30, a estrutura oligárquica abrangia a posse total do Estado, podia reproduzir
seu domínio ao bel-prazer. A dissidência se resumia ao protesto individual e
estigmatizado dos heróis descontentes.
Victor
Nunes Leal, no clássico “Coronelismo, enxada e voto”, associava a estrutura
oligárquica ao poder privado dos grandes proprietários de terras, que
controlavam praticamente todos os aspectos da vida municipal e, sobretudo, os viciados
processos eleitorais. Nos dias de hoje, ao contrário, a estrutura oligárquica
subsiste, neste caso, porém em concorrência com outras vontades coletivas da
sociedade civil. Persiste como estrutura de domínio, mas acabou a fase áurea de
domínio total da oligarquia sobre os recursos de poder.
O
fato inusitado é que mesmo depois de ocorridos os processos de industrialização
e da urbanização, consequentemente, da falência econômica dos grandes
latifundiários, a dimensão política da velha estrutura oligárquica rural
resista.
Muitas são as denúncias de votos comprados nas
atuais eleições. Pelo que se comenta, a cotação atual é de 100 mil reais
equivalerem a mil votos, em viés de alta. Ao se consorciar a operação de compra
de votos com estrutura oligárquica, a ênfase recai no outro lado do
balcão, os votos vendidos. Dever-se-ia perceber que o valor de troca contido
nesta transação mercantil reside exatamente nas entranhas dos arcaísmos da velha estrutura
patrimonialista; remete à excrescência da vigência, em pleno século XXI, do controle sobre os meios de
vida da gente pobre. Pobre Paraíba.
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