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Mostrando postagens de julho, 2008

Gitana dos 50 Anos

Jaldes Reis de Meneses O primeiro amor noves fora são rosas Adolescentes jogadas em definitivo ao chão. Sequer as pisamos, somente as amortecemos Mas delas para sempre ficaremos dementes. Do grande amor esquecemos, em vez disso O primeiro amor retorna no momento da memória, Gravado a ferro e fogo, marca de boi, persecutória Em uma página perdida de todas as biografias. O grande amor disse adeus, o primeiro desapareceu, Um tão perto, outro tão longe, de um sofremos Pelo outro fazemos um discreto gesto secreto. O que nunca houve para sempre será O que um dia teve nunca mais haverá O primeiro dia nasceu, o outro quem saberá?

João Cabral de Melo Neto:

Antes faço o plano do livro, decido o número de poemas, o tamanho, os temas. Crio a forma. Depois, encho. A frase de João Cabral, acima, foi colhida nos parágrafos derradeiros da inteligente apresentação feita por Eucanãa Ferraz (Belo, Bula) à nova edição de "A educação pela pedra e outros poemas" (Editora Alfaguara, 2008). Espero retornar à poesia de João Cabral nos próximos dias, através de um curto ensaio, por enquanto apenas escrevo que a forma de sua poesia, mais além de um evidente corpo a corpo com a linguagem na tentativa de parecer seco em seu antilirismo (ele adorava essa expressão, como também adoro, aliás), medrou na forma tortuosa de uma doação paulatina. O "homem seco" foi se doando e sendo tostado aos poucos, ao longo dos anos de labor poético consciente e racional - O engenheiro, O cão sem plumas (para mim, desde a adolescência, um dos principais poemas da língua portuguesa), A educação pela pedra, etc etc - pelo fogo-fátuo (de Fernando Pessoa), pelo

Linguagem de Adão: Proust e Benjamin

Ainda um post sobre a linguagem de Adão. Teria esta linguagem continuidade na música? Walter Benjamin foi um grande leitor e crítico de Marcel Proust. No trecho que reproduzo a seguir, o romancista francês narra a respeito da hipótese de uma linguagem anterior a verbal, para ele a linguagem da música. Leiam: "Eu me perguntava se a música não era por acaso o exemplo único do que poderia ter sido – se não tivesse havido a invenção da linguagem, a formação das palavras, a análise das idéias – a comunicação entre as almas. Ela é como uma possibilidade que não teve prosseguimento, a humanidade tendo tomado outras vias, a da linguagem falada e escrita". In: PROUST, Marcel. Em busca do tempo perdido (A Prisioneira, vol 04), pp 246. (Jaldes Reis de Meneses)

Linguagem de Adão: Drummond, Waly Salomão, Montaigne

A “linguagem adâmica” (Walter, Benjamin, Sur lê langage a general et sur le langage humain, Paris, Gallimard, 2000), sem dúvida uma manifestação primordial e atávica da mimesis, constitui um dos dispositivos permanentes, ontem, hoje e sempre, da construção poética. É por meio dela que se comunicam espontaneamente os animais na natureza (abdico de palavra de origem religiosa – “seres” –, propositalmente). Dou exemplo em três belos poemas, fixados na imagem, renitente e poderosa, da cobra (serpente e cobra coral): Cisma , de Carlos Drummond de Andrade, narrando a experiência de um encontro casual entre o olhar cismático de reconhecimento mútuo – talvez preparando o embate no qual vença o mais apto – do poeta com uma cobra coral, e vice-versa. Que se diga: o poeta e a cobra não se comunicaram em português nem sânscrito, mas pela linguagem adâmica natural: Cisma Este pé de café, um só, na tarde fina, E a sombra que ele, faz, uma sombra menina Entre pingos vermelhos. Sentado, vejo o mundo

Alberto Caeiro e Walter Benjamin: a linguagem de Adão

Há muitos caminhos, muitas veredas para a poesia. Ela aparece nos lugares mais surpreendentes, pois antes de tudo, até mesmo de ser linguagem, diz respeito à elaboração da experiência direta e desnuda, bruta, do real, ao nosso corpo a corpo com natureza, como nos ensina, aliás, o heterônimo-mor (Alberto Caeiro, o poeta pagão) de Fernando Pessoa (um que poeta teve ao mesmo tempo um projeto filosófico, não se enganem, absolutamente consciente e medido, um dos motivos de ser talvez o mais instigante dos poetas modernos, em todas as latitudes). Walter Benjamin, na juventude, chamou a esta experiência desnuda com o real (ainda não me refiro à “realidade”) como “linguagem adâmica” (a linguagem de Adão), no fundo para refletir um paradoxo: a possibilidade entrevista de nomear diretamente pelas sensações. Reparem neste poema de Caeiro: [ 283] 1-10-1917 O Universo não é uma idéia minha. A minha idéia do Universo é que é uma idéia minha. A noite não anoitece pelos meus olhos, A minha idéia da no

Antonio Cicero

Recebi e-mail pessoal do poeta e filósofo Antonio Cicero que resolvi postar, acerca de meu poema e o comentário crítico sobre Baudelaire, recém publicado no "Correio das Artes". Sei que a seriedade crítica do autor, um dos principais poetas brasileiros contemporâneos, não permitiria elogios fáceis. Opiniões assim me encorajam a encarar face a face o sibilino encontro com as musas: "Caro Jaldes, Obrigado por me enviar o seu poema e suas considerações sobre Baudelaire. Estas são muito interessantes, mas o poema é que é bom mesmo. Gostei muito. Parabéns. Antonio Cicero"

Satiagraha II

A gritaria em torno de uso de algemas e os delírios do inquérito do delegado Protógenes são meras manobras diversionistas visando tirar o foco do principal. Co-participam da operação diversionista senadores do DEM, blogueiros e jornalistas ligados aos comendadores das privatizações no governo FHC e membros de atual governo, numa verdadeira Santa Aliança. Se a questão for mesmo o constrangimento das algemas, sugiro prender com luvas de pelica. Resolva-se o espírito dos corações finos. (Jaldes Reis de Meneses).

Satiagraha

Há muitos pontos de interesse em uma análise de conjuntura a partir da chamada "Operação Satiagraha " da Polícia Federal, que prendeu por algumas horas duas vezes o peixe graúdo Daniel Dantas e outros consortes (até chegar no hoje miudo Celso Pitta ). Por enquanto, fico apenas em um item: a irmandande do aparelho tucano- petista na operação do novo capitalismo brasileiro, após o plano real. As evidências começaram com o " mensalão " (embora este seja apenas um nó atado em um intricado bordado), cuja investigação ( CPI dos Correios) mostrou a quem quis ver como uma conexão originária de Minas Gerais - a campanha de reeleição do ex-governador Eduardo Azeredo, filiado ao PSDB - prosperou em um governo do PT. Depois, mesmo que o mensalão já tivesse permitido aflorar o jogo duro do complexo Dantas / Opportunity , resumido, por exemplo, nas conexões com as privatizações do governo FHC - principalmente a privatização do antigo sistema Telebrás -, agora, mais até q

Benjamin e Baudelaire

Passei por uma experiência prazerosa recentemente: a feitura de um pequeno poema em cinco seções de oito versos longos – Baudelaire –, concebido de início quase ao acaso (os versos do poema estão publicados entre os cinco poemas do post abaixo). A chamada "inspiração" pelo senso comum veio a partir da pesquisa sobre materiais bibliográficos de um curso sobre modernidade na Universidade, precisamente o curso de Pós-Graduação em História da UFPB . É feito a trama um novelo: uma vez puxado, um mundo de questões aparecem e reaparecem. Tento, agora, com mais tranquilidade , depois da tempestade catártica , debater a algumas destas questões. As questões que surgiram me levaram a uma decisão, embora ela nem seja tão firme assim (posso abandonar boas idéias sem remorso): continuar a desenvolver o poema inspirado em Charles Baudelaire, em nem sei quantas estrofes e versos que virão a lume, sem, contudo, querer transformá-lo em uma biografia versificada, oscilante entre o chato e

Correio das Artes

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Uma vez querendo abrir o arquivo, pode-se pode ler acima, em fac-símile, 5 poemas meus publicados na edição do "Correio das Artes" de domingo (06/07/08), uma bem cuidada edição de Linaldo Guedes.

Paraíba do Norte

Jaldes Reis de Meneses Sanhauá, rio cujas águas jamais me banharam: Não lhe comemoro as águas, somente a sonoridade. Varadouro, face deformada de um anjo barroco descendo: Não lhe vi crescer nem declinar, já lhe encontrei em ruínas. São as ruínas que comemoro. (Este poema, escrito de uma só tacada em agosto do ano passado, imediatamente publicado no blog, diz respeito ao mesmo tema do post anterior. Desmontem o enigma, mas é tudo tão claro...).

Papéis extemporâneos II: 1930, Gramsci e Florestan; ordem social e bloco histórico

O artigo que segue abaixo é mais um “papel extemporâneo”. Foi escrito em 2000, como uma espécie de roteiro pessoal, na ocasião de participação em uma mesa-redonda de balanço sobre o movimento “revolucionário” de 1930, certamente o principal episódio histórico do século XX brasileiro. Embora confeccionado para exposição pública, originariamente não pensava em publicar este material, entre outros motivos porque destoa do chatíssimo formato de “ paper ” acadêmico (imaginem a perda para a filosofia se Nietzsche tivesse cometido mais um desatino, trocando os aforismas desconsertantes pela forma- paper ) , mas principalmente por motivo de seu tom ser mais de auto-esclarecimento, uma espécie de solilóquio comigo mesmo, testando a validade de certas ideias no papel, com base em leituras sistemáticas de autores que estudaram a formação do Brasil. As leituras incluíam , entre outros, de Manuel Bonfim (o primeiro a desmontar as teses racialistas em plena república velha, uma personalidad

Papéis extemporâneos: Agostinho da Silva

Cascaveando papéis extemporâneos , encontrei esta pequena apresentação que fiz a uma exposição sobre o intelectual português Agostinho da Silva, ocorrida na UFPB em maio de 2006. Agostinho viveu muitos anos no Brasil e quando do retorno a Portugal, depois da abertura política permitida pela Revolução dos Cravos (1974), transformou-se, por sua verve erudita e desabusada, num astro da televisão dos irmãos lusitanos. A metáfora de meu texto é gasta, mas decisiva: a atracão dos portugueses pelo mar oceano, de Camões e Pessoa, até, pode-se dizer mais recentemente, José Saramago, na bela novela “Jangada de Pedra”, em que, ao invés de embarcações de partida, quem dá adeus ao continente europeu é o próprio território de Portugal inteiro, seguindo a uma vocação parecida com o mito platônico de Atlântida , o continente perdido. Nas viagens nos perdemos e podemos nos reencontrar através da experiência do novo.( Jaldes Reis de Meneses). QUEM FOI AGOSTINHO DA SILVA? Em certa passagem de seu